segunda-feira, 12 de abril de 2010

Artgos - 06 de Abril

.



DAQUI DE TAUBATÉ

Se não vai di anssim, tão vai a zóio memo! Passo perto do bar e ouço o balconista. Gosto de ouvir. Não é dialeto. É português autóctone!

Gosto imenso de Taubaté, cidade para onde vim aos dois anos de idade, oriundo dos morros de Machado, em Minas. Pai paralítico por acidente, família pobre, lembro-me da cidade que através do SESI promovia encontros com as crianças. Taubaté cuidava bem dos pequenos. Esporte, distribuição de presentes no Natal, animação de rádio do Cesar Moreira e do Silva Junior no domingo da petizada.

Lembro-me do Anacleto Rosas, dos livros de Monteiro Lobato, do Sitio do Picapau Amarelo, dos Cines Urupês, Palace e Boa Vista, onde filho de operário da Juta e da CTI assistia de graça os filmes de Durango Kid e Roy Rogers. Descíamos o morro montados em cabos de vassoura e imitando os mocinhos enquanto atirávamos com os dedos e com a boca.

Foi na descida da Juta que caí da bicicleta sem freio alugada por alguns “destoes” e meu braço virou para trás. O Dr. Avediz me desafiou perguntando se eu era homem para não chorar. Respondi que ainda era um menino, mas que não choraria. E não chorei! Tinha oito anos! Tínhamos brio! Ninguém desistia só porque caíra. Voltei a descer o morro, desta vez com bicicleta de freio.

Gosto de Taubaté onde há uma safra de bons artistas e cantores, um dos berços da moderna música católica, assim me dizem! Na verdade meu trabalho começou em São Judas, São Paulo. Mas vim para cá outra vez em l980. Mas Taubaté traduz cultura, boas faculdades, bons hospitais, razoável distribuição de renda, boas e grandes indústrias, locação privilegiada entre o mar e a montanha, restaurantes de primeira linha, igrejas que dialogam; não tanto quanto deveriam, mas bastante.

Gosto de chegar na Faculdade Dehoniana e no Convento onde moro e ver, em caminho, a faixa em defesa dos animais, porque animal não é brinquedo, sente fome dor e medo. Gosto de ver os anciãos se exercitando na academia ao ar livre, na praça da velha rodoviária, construída só para eles. Gosto dos nossos museus e das nossas muitas casas de cultura.

Quanto à imaginária Velhinha de Taubaté do Veríssimo, que acredita em todo mundo e até no Governo, eu nunca a encontrei. Também não tive a aventura de ser apresentado à Neide Taubaté do Chico Anísio. Mas passo pela cidade, pelos bairros, vejo as casas simples e pobres, mas bem cuidadas, passo pelas vilas de classe média e vejo que aqui as coisas têm dado certo. Não conheço bairros de milionários. Não vejo luxo em Taubaté. Vejo conforto. É uma boa cidade.

Se é bom viver aqui? Acho que sim! Conheço 55 países, para onde me levou minha missão de anunciar Jesus. Conheço o Brasil de ponta a ponta. Até dizem que já fui um padre famoso, agora que despontam outros famosos por aqui, o Padre Joãozinho e o Padre Fábio de Melo. Ando fora porque ainda não parei a vida missionária, mas, quando volto celebro nas capelas, no meio do povo simples que me pergunta por que não tenho guarda-costas. Respondo que nunca tive. Nunca fui famosos a este ponto! Melhor para mim que não assinei contratos perigosos que me exporiam demais!

Gosto de andar no meio do povo do jeito que ele é e eu do jeito que sou. Converso com a elite pensante que ouve minhas pregações e as comenta. Dou aulas. Vejo os seminaristas e sua fome de conteúdo. A cidade também quer pão e cultura. E parece que os tem.

Se é tudo perfeito? Não é nem será. Mas tudo considerado, a vida aqui é serena. Montanhas à direita, o mar à esquerda, o Paraíba a lhe banhar os limites, a Dutra e a Carvalho Pinto a cruzá-la. Aparecida e Campos do Jordão a quarenta minutos, o mar a oitenta quilômetros. Aqui onde moro, mas moro, aprende-se muito. Acabei de ir ao mercado ouvir o sotaque do Registro. Cunvers, num vorto mai lá qu urtimavei que fui lá o cachor mordeu eu! Se é português caipira? Não. É cultura Taubateana, que Monteiro Lobato soube valorizar, que Mazaroppi transformou em comédia, o Cid Moreira em português castiço e bem pronunciado, o Anacleto em música sertaneja, o Renato Teixeira em canto interiorano elaborado, a Hebe Camargo em conversas de comadres felizes e ligadas ao cotidiano.

Gosto de Taubaté. Há trinta anos querem dar-me o título de cidadão Taubateano, porque sou das montanhas de Minas. Ainda não aceitei. É que sou daqui também e como há milhares de Taubateanos adotivos, penso neles. Primeiro eles, depois eu. Fazem mais por Taubaté do que eu fiz. Um dia quem sabe! Mas, pensando bem, porque diploma e prêmio? Morar aqui e ter aprendido aqui as primeiras letras e primeiras canções já foi meu prêmio.

Onde acham que comecei a gostar de música e de literatura para depois chegar ao mundo inteiro com meus Lps, CDs e DVDs em, shows e livros? Meus cinco irmãos, Dona Wanda, Professor Mário, Dona Anita, Dona Angelina, Dona Maria José Arantes, Padre Teodoro, Padre Fisher, padres Ivo, Humberto, Matias e André têm algo a ver com isso! Não fossem eles, eu não teria aprendido o que aprendi, nem sonhado o que sonhei.

Pensando bem e outra vez, acho que sou um produto de exportação de Taubaté! E aviso que aqui onde moro há muito mais cabeças como a minha, a do Pe. Joãozinho e do Pe. Fábio. Aguardem alguns anos e verão. Conheça nossos cantores e nossas cantoras, nossos professores, nossos universitários, nossas empresas, nosso restaurantes, nossas figureiras, nosso canto e nossa arte. Terá uma idéia de Taubaté que incidentemente, não acha que o Governo é bonzinho e está certo em tudo. Nisso, a velhinha de Taubaté está sozinha!



MÍDIA labirintos e sementes

Dirão que me preocupo demais com a mídia ao escrever sobre ela e suas conseqüências, mas eu leio os documentos da nossa igreja e os das outras e percebo que lidar com a mídia é preocupação da maioria dos religiosos educadores. A mídia pode fazer imenso bem e pode causar imensos desvios. É como faca na mão de criança ou de escultor despreparado. Pode ferir quem brinca com ela. Pode ferir e fere.

Não sou profeta, mas estudo mídia há mais de 40 anos e sei que mais de 500 pessoas famosas morreram, exatamente por causa dela. Entraram nos seus intrincados labirintos, um dos quais é a fama, sem conhecer as saídas nem o caminho de volta e só saíram de lá mortos. Entre eles contabilizam-se também famosos missionários e pregadores. Sem achar a saída, morreram e até mataram. Tudo começou com a mídia e a fama que qual cavalo xucro, desembestou, ou carro sem freio, tomou velocidade e se desgovernou.

É bom lembrar que labirintos às vezes sufocam e matam e que sementes não conhecidas às vezes dão frutos que não se buscava. Conhecer a semente, o cultivo e o solo é fundamental para o semeador. Conhecer as rotas de escape é fundamental para o espeleólogo ou para o alpinista.

Acontece com a mídia moderna que muitos entram nela pela empolgação do momento e da grande chance, ignoram quem a estudou, e, tendo achado uma semente rara, jogam-na ou plantam do seu jeito, sem olhar os detalhes do semeio ou do plantio; acharam a entrada que garantia levar a milhões de ouvidos e olhos e entraram. Foi vôo entusiasmado, mas cego. Todo mundo via, só eles não viam!

Feliz de quem foi até onde podia e voltou atrás. Alguns, infelizmente, não acharam mais a saída. Elvis Presley e Michael Jackson, Marilyn Monroe e o pastor Jim Jones são os mais comentados. Não foi a droga, nem a depressão que os levou. Isso veio depois. Foi a mídia e afama não assimiladas que trouxeram o resto. Feliz do artista, do escritor, do desportista, do cantor, do religioso e da modelo que souberam até onde ir, até onde se deixar levar e quando parar.

Há mídias lentas e mídias velozes demais. Em termos de mídia, a velocidade mata o talento e a alma! Um curso de como lidar com a fama que vem com a mídia seria muito oportuno para quem não percebe que está deslumbrado ou deslumbrada com os holofotes. Artistas mais experientes e religiosos mais vividos tentam aconselhar, mas nem sempre são ouvidos. A chance fala mais alto. É, agora, ou tudo ou nada. Muitos acabam no nada!

Veículo maravilhoso ela pode se encapelar, como oceano em tormenta. Há sempre algum Triângulo das Bermudas em toda mídia. Navegar é preciso, às vezes, fugir é fundamental. Depende de quem foi e até onde foi. Falarei mais sobre o assunto nos próximos temas.



PORQUE SERVIR À IGREJA

Amigos e adversários me perguntaram por que sirvo à Igreja Católica, ontem e hoje tão controvertida. Isso mesmo, e já vai para cinqüenta anos. Respondi que controvérsia existe por toda a parte. Se tivesse escolhido ser político ou servir algum exército vede ou vermelho também a encontraria. Além do mais, nutro a convicção de que sirvo é a Deus e ao meu povo e faço isso na instituição chamada Igreja Católica.

Ao escolher a vida que vivo escolhi o sinal, a provocação, a controvérsia, mas também o diálogo, o estudo, a prece, a convivência e a paz. De alguma forma sou mestre e sou visto como mestre. Se outros quiseram ser mestres em história, sociologia, filosofia, medicina, ciências biológicas e política, eu quis ser um eco de Jesus, portanto: catequista e mestre de espiritualidade, o que não me parece coisa pouca nem pequena.

De homens e mulheres que assumiram crer e ensinar espiritualidade nasceram hospitais, creches, asilos, orfanatos, universidades, grandes obras de filantropia, grandes livros, grandes estudos, grandes descobertas, o processo civilizatório da Europa, da América Latina e de boa parte de outros continentes. Houve erros? Houve. E as ideologias de hoje também não impuseram e não erraram?

Os católicos iam lá anunciar Jesus do jeito deles e lá criavam escolas e cidades. Aconteceu no Brasil onde milhares de obras sociais têm o sinal da cruz nas suas paredes, onde famosas universidades de hoje nasceram de escolas católicas de ontem e onde, primeiro existiu uma capela no lugar em que hoje se erguem pujantes metrópoles.

É a esta Igreja que eu sirvo com todos os limites de uma agremiação de pessoas. Estamos no mundo há seguramente 20 séculos, ou como querem alguns, há dezessete séculos desde que nos chamamos de católicos, o que é mais tempo do que a maioria dos países e continentes de hoje, mais do que a maioria das igrejas e mais do que a maioria dos partidos e instituições de agora. Se duramos tanto tempo é porque soubemos durar e não nos faltou a graça de Deus que, cheio de misericórdia, viu nossos pecadores mas viu também os nossos santos e mártires.

Não tenho porque me achar mais do que os outros por ser católico, mas também não tenho porque pedir desculpas por servir a uma Igreja que modificou a história do mundo. Não devo encurralar ninguém com meus argumentos, mas também não tenho porque deixar me encurralar por este ou aquele autor que nos diminui. Mostro a quem me fala deles e de suas denúncias, centenas de outros que nos respeitam e admiram. Além disso, historiadores são humanos: há os que só destacam o lado bom e os que só acentuam o lado ruim. E há os honestos que mostram o poder, a glória e as derrotas. Fico com estes. Faço o mesmo diante dos pregadores de religião. Suas religiões e igrejas têm méritos e pecados, também a nossa. Respeito-os e espero ser respeitado.

Disse mais aos meus amigos naquela tarde fria de fogo a crepitar na lareira. Não escolhi ser sacerdote e aceitar que me chamem de reverendo e de padre apenas pelas honrarias e medalhas. Eu sabia que seria questionado porque teria que ensinar a doutrina da Igreja que é muito mais do que confeites, pudins e chantilis. Ela mexe com relacionamentos humanos e macro-políticas. Eu teria que anunciar e denunciar. Sabia disso há cinqüenta anos e sei agora. Se aceitei é porque achei que a isso Deus me chamava.

Continuo não me achando melhor do que os outros, mas não silenciei nem escolhi o conforto da palavra que agrada. Abracei um caminho que às vezes fere primeiro o pregador. Sirvo a Deus, assim penso eu, numa Igreja rica de história e de martírios. Os pecados? Sou leitor de História. Sei o que houve com outras religiões, com as esquerdas e direitas e outras ideologias. Não fujo ao debate. Espero que eles também não fujam! Não se descartam vinte séculos com algumas frases feitas. Nem do nosso lado nem do lado deles!

Padre Zezinho, scj

.................

Nenhum comentário:

Postar um comentário