quarta-feira, 21 de abril de 2010

Artigos - 19 de Abril

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O CRISTO QUE DESCE

Entre os cristãos vigora a mística da kênosis. Tem a ver com descida, esvaziamento, descer ao abismo com a vítima para trazê-la à superfície. Não é descer uma corda de lá de cima e puxá-la. É mais. É descer com a corda, amarrar a vítima ao próprio corpo, já que ela não tem forças, nem mesmo para agarrar a salvação. Fazem isso bombeiros, marinheiros e outros salva-vidas.

Para nós, cristãos, o verdadeiro Cristo é aquele que desceu para resgatar o pecador e subiu levando o pecador ao ombro, deixando lá em baixo o pecado que o prendia. O Evangelho de João (3,13) e Paulo magistralmente ensinam isso. Dizia Paulo: Achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz. (Fp 2, 8) Em Gálatas 3,13 ele torna a falar dessa descida, a ponto de Jesus aceitar uma situação de maldição para dar sentido às cruzes do cotidiano. Morrer pelos outros nunca é derrota. Matar é que é.

Por isso também entre nós, só pode ser verdadeiro profeta aquele que primeiro desce e depois sobe levando os outros. O que desesperadamente sobe em busca de dinheiro, fama e notoriedade como quis fazer Simão o Mago, dificilmente desce. Pensa demais em si mesmo. Este é o falso apóstolo. O aviso não é para os outros: é para cada um de nós que precisamos saber o que fazer com riquezas, posição e fama, se vierem.

Profeta que mais coleta e acumula do que distribui está trilhando caminho tortuoso. Quem quiser justificar riquezas, tronos, palacetes, recompensas e galardão, vai achar alguns textos. Mas se não ensinar também os textos que falam de pobreza, desprendimento, descidas, renúncias, perdas e cruzes terá deturpado o evangelho.

E chamando a si a multidão, com os seus discípulos, disse-lhes: Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome a sua cruz, e siga-me. (Mc 8, 34)

Porque o Filho do homem também não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate de muitos. (Mc 10, 45)

Não faz tempo ouvi alguém a pregar que, se Jesus vivesse hoje também teria aviões e helicópteros e moraria em condomínios porque mereceria... Duvido! Tudo nele falava de kênosis. Foi ele quem disse que as raposas têm covis, e as aves do céu têm ninhos, mas o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça. (Mt 8, 20) Não tinha porque não arrecadava o suficiente ou não tinha porque não queria?

O mestre que lavou os pés dos discípulos. (Jo13,12), o puro e sem pecado se curvou diante da pecadora que permanecia em pé, desceu até nós para nos elevar. (Jo 8,3-11) Não jogou a corda. Desceu e amarrou-nos a Ele. Registre-se esta forma de ascese!



ENTRE O COPO E O CÁLICE

Falo de sofrimento. Enorme sofrimento para o pregador e para a sua comunidade. Falo com a maior delicadeza possível. Se não era, virou enfermidade. Para as igrejas, faz tempo que virou angústia. Se já dói numa família de cinco pessoas, imagine a dor de uma família de 80 mil paroquianos... Afeta quem prega e quem ouve. É humilhante para todos.

O tema é delicado, mas precisa ser abordado. O alcoolismo tem sido uma das cruzes mais pesadas das igrejas cristãs, principalmente quando subjuga seus pregadores, alguns deles cultos e preparados, mas incapazes de permanecer lúcidos, antes e, muitas vezes, durante as pregações. O copo a mais os derrotou.

Se tivessem admitido ajuda enquanto jovens ou no tempo de sua preparação, talvez não tivessem tomado aquele copo a mais nas festas e encontros. Se me lembro bem, um grande número dos ontem seminaristas que conheci, e não só os da nossa igreja, quinze ou vinte anos depois de ordenados perderam o controle da dose justa. Bebiam cinco a seis copos de cerveja, duas garrafas, ou dois a três copos de vinho e até se gabavam de nada sentir. O tempo deu vitória ao copo. Perderam.

Algumas dioceses nos Estados Unidos pedem do sacerdote um juramento de não beber por cinco anos. Depois disso, o sacerdote se compromete a ser acompanhado periodicamente para não perder a batalha entre o copo e o cálice. Numas delas, onde celebrei, uma frase na casa paroquial lembrava: “No more than one glass a day, if you are to daily raise the salvation chalice!” “Não mais de um copo por dia se você pretende diariamente elevar o cálice da salvação”.

Lembro-me que discutíamos abertamente entre nós a possível tendência à bebida. Lembrávamos os familiares e as desculpas usadas para ir além do copo. Com tristeza lembrávamos colegas e outros sacerdotes que tiveram que ser substituídos por causa do copo a mais. Na faculdade os seminaristas evangélicos tocavam nas feridas de suas comunidades. O álcool era e continua sendo uma das cruzes que mais afetam o púlpito. Quem é vitima dele não admite. Se admite, ou se ofende e rompe a amizade, ou mente para si mesmo dizendo que o que ele faz não afeta a comunidade.

Numa cidade cujo nome não vem ao caso, havia duas paróquias distantes não mais de dez quadras uma da outra. Num domingo, às 11 horas onze casais iriam batizar suas crianças. Um deles, marido e mulher eram líderes comunitários. Infelizmente o sacerdote chegou agressivo; bebera e mal se mantinha de pé. Assim que começou a chamar os nomes, o casal viu o risco para a fé dos presentes. Pediram um tempo ao padre. Cochicharam. Em dois minutos todos se retiraram. Mas de 100 pessoas. Foram todos de carro para a paróquia vizinha, onde esperaram que um dos dois padres chegasse. Quatro casais os conheciam. Avisado pelo celular, o pároco chegou o mais rápido que pode.

Às 13 horas as crianças foram batizadas. Ninguém deixou a igreja. Tiveram pena da enfermidade do seu pároco, mas não admitiram que suas crianças recebessem um sacramento daquela forma. O padre, pela primeira vez chocado e ferido, apresentou-se em lágrimas ao bispo, pediu ajuda e internou-se. Mudou de paróquia e hoje auxilia um colega da mesma diocese. Nunca mais tocou num copo. Ainda chora quando se lembra do episódio. Pediu perdão a cada uma das famílias. Sua humildade e penitência reconquistou-as.

Agora, quando vai a uma festa, a primeira coisa que pede aos amigos é esta:-“Não tirem os olhos de mim. Eu tenho esta enfermidade. Se não for ajudado, entre o copo e o cálice, escolho o copo! É minha cruz, mas não pode ser crua da paróquia!”. Amado e respeitado, o carinho dos paroquianos o recuperou. É hoje benquisto nas duas paróquias. Seu irmão padre, diabético, vigia o que come, ele vigia o que bebe! Santos também escorregam, mas os humildes não mentem para si mesmos, pedem ajuda e se levantam!

Nenhum de nós tem o direito de atirar a primeira pedra. Deus não fabrica santinhos nem tijolos. Cria gente que às vezes se fere gravemente. Alguns deles atuam em púlpitos!



PAÍS QUE AMADURECE

Que nem tudo vai bem com o Brasil e com praticamente todos os países do mundo, é sabido. Também se sabe que há países com maior e menor grau de cidadania. Na “Republica” da Platão, Livro V, um dos critérios de cidadania era a capacidade de os cidadãos saberem o que era e o que não era deles: o “meu” e o “não meu”. A julgar pelos colossais desvios de verbas, pelos impostos ditatoriais que nem sempre retornam em forma de melhorias, pelos preços sempre acima das tabelas, pelos salários sabidamente injustos, pelos caixas dois de partidos, pelos apadrinhamentos, pelos ladrões de gravata ou de chinela, estamos longe desta cidadania. No Brasil, boa parte do que seria do povo acaba em mãos de políticos inescrupulosos com seus apadrinhados.

Mas estamos melhorando. Já houve ex-governador preso, governador pilhado em flagrante e preso, deputados obrigados a renunciar, mensalão provado e documentado. Se nem todos foram punidos, já é um bom começo que a mídia publique e mostre os documentos da corrupção. Apesar dos seus defeitos, sem a imprensa este país seria bem menos democrático. Igrejas que apenas anunciam não servem. Igreja também precisa denunciar o que fere o povo.

Como país estamos entre o mais e o menos, um pouco mais para mais do que para menos. Temos mídia mais ou menos isenta, igrejas mais ou menos abertas a diálogo e desapegadas de riquezas, policiais mais ou menos preparados e honestos, Ongs mais ou menos honestas, políticos mais ou menos desapegados e honestos, organismos fortes, racismo combatido, produtos mais ou menos de alta qualidade, impostos mais ou menos sonegados, preconceitos condenados, violência denunciada... O mostrador se aproxima do mais e se distancia do menos.

A população ainda segrega, mas com delicadeza. A segregação é hoje de cunho econômico. Índios e negros podem ser vistos ao lado dos brancos, desde que cada qual na sua devida classe... Por isso temos piscinas, condomínios, hotéis, shoppings, lojas e restaurantes de ricos, de classe média e de pobres. A cor da pele já não importa. Importa o poder aquisitivo. Entra quem tem como pagar! Há shows aonde o pobre não vai e shows aonde o rico não vai. O preço os separa. Mas já temos um presidente sindicalista de sucesso que veio da pobreza e ainda fala como pobre e ex metalúrgico; seu vice-presidente é um empresário de sucesso que se mostra corajoso sereno e simples. Um país onde se pode eleger dois cidadãos supostamente opostos não vai assim tão mal!

Entre os candidatos à presidência, praticamente todos são de esquerda moderada. Ninguém tem a intenção de dividir o país em dois ou de por fogo nas instituições. Não há nem haverá bolivarianismo por aqui. Há quem já foi guerrilheiro, mas jura que nunca pegou em armas, quem foi exilado por combater a ditadura, quem quis o poder pelas armas e agora não quer mais; há quem veio da pobreza e subiu na vida pelo estudo e pela pertinácia. Também há católicos, evangélicos e ateus, gente bem casada e quem sofreu a tristeza do divórcio. Eles conhecem a dor, a decepção e sabem que um país não é feito nem de pessoas nem partidos angelicais. Mas querem o melhor. Parece que nos convertemos ao diálogo.

Vejo isso nos restaurantes de ricos e de pobres: chão limpo, mesas limpas, ninguém fumando, pessoas educadamente nas filas. Também nas filas de banco e de padarias, cada qual espera a sua vez. No metrô e nos ônibus a maioria dos jovens cede a vez aos velhinhos, as crianças são respeitadas, nos estacionamentos há vagas para os idosos e os portadores de algum limite, as grávidas ainda encontram delicadeza. Nosso presidente e nossos militares foram ajudar o Haiti que perdeu 200 mil vidas e o Chile que foi literalmente devastado. Poucos brasileiros se queixaram. Acharam certo. Existe o senso de alteridade. Também fomos vítimas de enchentes e sabemos o que é perder tudo e recomeçar.

Não somos um povo tão desorganizado. Ainda se respeitam os juizes e estes ainda levam em consideração os direitos da pessoa. As igrejas ainda se encontram e, mesmo os pregadores que não dialogam, já não chutam os símbolos um do outro. Diminui o número dos que se proclamam mais eleitos do que os demais. Fiéis e pregadores hoje contentam-se em se proclamarem eleitos.

Este ainda não é o país dos meus sonhos, mas já não é o país dos meus pesadelos. Há bandidos, há droga, há feras humanas passeando pelas ruas e arrastando velhinhos e crianças, há meninos queimando índios e empregadas em pontos e ônibus, há criminosos espreitando nossas casas. Mas tudo indica que serão derrotados. Melhoramos e melhoraremos. Parece que o país adolescente irresponsável de ontem começa a amadurecer. É possível que daqui a vinte anos os partidos, as igrejas, o judiciário, a receita, as mais diversas instituições terão se aperfeiçoado a ponto de não ser preciso pegar em armas para mudar a cara da Nação. Movimentos violentos perderão o apoio do povo. Terão que se enquadrar na vida política, como os outros fizeram. Talvez estejamos condenados a fazer política e a dialogar, o que é bem melhor do que derramar sangue em nome de fé ou de ideologia.

Tudo somado, sou um brasileiro que lutou 45 anos como sacerdote para ver meu povo dialogando. Não fui e não sou o único. Acho que vencemos. Ex guerrilheiros e combatentes, ex exilados, chegaram ao poder e à maneira de Nelson Mandela entenderam que vingança não leva a nada. Os que ainda conservam ódio no coração terão que amansar. Talvez não sejamos o Brasil que eles queriam, mas faz tempo que nos transformamos num país que não quer mais revanche nem ódio, venha ele da esquerda ou da direita. Os irados que se acalmem, e os calmos demais que aprendam a ira justa. Aí, talvez, possamos cantar que nossos risonhos lindos campos têm mais vida que nossa vida neste colo tem mais amores. Quem viver verá! Sonho com um Brasil parlamentarista, porque um povo que não aprende a parlamentar mais cedo ou mais tarde acaba por se lamentar. Oro para que tal tsunami não nos aconteça!



UM BRASIL SEM DESPERDÍCIOS

Em boa hora, como sempre, a Campanha da Fraternidade, desta vez e outra vez ecumênica, entra em tema social. Tema forte. Não há como amenizá-lo e pregar apenas espiritualidade. A campanha olha para um dos aspectos mais dolorosos da vida de um país: o uso da sua riqueza.

Bem escrito, o manual da Campanha nos brinda com reflexões profundas nascidas das várias igrejas que participam. “Economia para Vida”, “Economia e Vida”. Não é distinção pequena. A capacidade de administrar os bens da nação e da comunidade produz vida mais adiante e é um ato de vida agora. Não é possível desligar o uso dos bens da vida e da sobrevivência de um povo.

Um desvio colossal de 700 milhões de reais, praticado por um pequeno grupo de ladrões de gravata e de vestido chique pode deixar milhares de crianças sem escolas, milhares de pessoas sem um teto, ou milhares de enfermos sem remédio. Desperdício, corrupção e desvio de bens é morte ou perda de qualidade de vida para milhares ou milhões de cidadãos.

A Campanha, em boa hora, alerta para o fato de que muitos consomem o que não precisam e não poucas vezes armazenam e jogam fora água, alimentos e roupas que irão para ninguém. Se o comunismo foi péssimo, o consumismo também é. Um em ditaduras de esquerda concentrava o poder em poucas mãos, o outro concentra bens em poucos bolsos e prateleiras. Um queria corrigir o outro e ambos exorbitaram. Nada melhor do que boas famílias, boas igrejas, boas democracias, bons partidos, bons sindicatos de patrões e de operários para não esbanjar o que a todos pertence.

Se parece utopia, será melhor do que aquilo que mês após mês freqüenta nossas manchetes: alguém desperdiçou água, verduras, cereais, dinheiro, recursos e bens que eram de todos. Maus administradores e gente safada no poder puxaram para si o que era de todos.

Um país tem que aprender a se defender contra tais pessoas, não importa o grau de poder que acumulem. Para isso o país tem que ter imprensa livre, juízes com tempo hábil para julgar, promotores com liberdade para agir, igrejas que não apenas ensinem a orar e sim também conduzam pregações que eduquem o fiel para os temas sociais.

Se é religioso ir ao templo e louvar o Senhor toda quarta e domingo, também é um ato religioso poupar água em nome do futuro e em favor da comunidade que sofre o drama da sede. Não é mesma coisa, mas nascem da mesma verdade os atos de levar a Palavra de Deus e água e esgoto a um bairro onde faltam os três benefícios. Pode não parecer, mas são gestos de fraternidade!



O PRESIDENTE E A IDEOLOGIA

Soou contundente a frase do dissidente Guillermo Fariñas, vitima da repressão em Cuba e punido por subversão, depois da morte por greve de fome, de Orlando Zapata e da frase infeliz do presidente brasileiro Luiz Inácio da Silva que o comparou a um bandido comum. Disse Fariñas, também ele em greve de fome por direitos humanos em Cuba: “A história se encarregará de colocar Lula em seu devido lugar”. Guardem esta frase porque não tem nada de novo. A história já pôs no devido lugar papas, reformadores e conquistadores de renome.

“Fizeram coisas boas, mas disseram coisas bobas”. E fizeram bobagem ainda maior. Perguntem aos historiadores! Pessoas de fama e renome pagaram alto preço por não fazerem ou não terem dito o que deveriam dizer quando era sua vez de mostrarem quem eram. Ficou como mancha nas suas biografias, Lutero ter permitido um massacre de camponeses e revolta, Calvino ter, de certa forma, sido a causa de Miguel Serveto ser queimado vivo como herege. Papas como Libério e João XXII nunca mais escaparam da pecha de hereges por terem silenciado ou cedido em questões fundamentais. E tinham feito coisas boas!

Lula tem feito coisas boas, mas algumas de suas posturas se revelam mais ideológicas do que democráticas ou éticas. O governo Lula mais que depressa devolveu a Cuba esquerdista dois atletas cubanos que pediam asilo, sob a alegação de que se arrependeram do pedido. Ou a mídia não os entrevistou ou assinaram um papel que não foi mostrado. Tiveram que voltar para Cuba.

Mais que depressa o governo devolveu um direitista acusado de crimes para ser julgado num país de esquerda. Mas hesitou em devolver um esquerdista histórico italiano acusado de terrorismo e de morte. O caso continua pendente a depender apenas do presidente. Um dos seus ministros argumenta que seu governo só se relaciona com governos. Pois é o governo italiano que pede a extradição do esquerdista acusado de terrorismo. Vai devolvê-lo ou não vai?

Diz o governo que não tinha porque interferir no caso do grevista que morreu de fome porque Cuba é soberana. Mas comparou-o a bandido comum, logo o Lula que não era bandido e que também fez greve de fome, tendo inteligentemente parado em poucos dias. O governo cedeu. Se a ditadura de direita não tivesse cedido e se Lula tivesse morrido de fome, a culpa seria de quem? Do opositor Lula ou da ditadura? A ditadura de Cuba não cedeu e a culpa foi de quem? Lula jogou a culpa no grevista que pôs o governo dos irmãos Castro em situação incômoda. Compará-lo a bandido e não dizer aos amigos o que um democrata deve dizer manchou a biografia do até agora democrata Lula.

Por isso soa contundente a frase de Guillermo Fariñas. Quando a ideologia soa mais forte do que filosofias, antropologias, sociologias e a teologias, perde o povo e perde o líder. Diante do mesmo fato o que teriam dito Mandela e Mahatma Ghandi? Teriam culpado a greve de fome?



MÍDIA, LABIRINTOS E SEMENTES

Dirão que me preocupo demais com a mídia ao escrever sobre ela e suas conseqüências, mas eu leio os documentos da nossa igreja e os das outras e percebo que lidar com a mídia é preocupação da maioria dos religiosos educadores. A mídia pode fazer imenso bem e pode causar imensos desvios. É como faca na mão de criança ou de escultor despreparado. Pode ferir quem brinca com ela. Pode ferir e fere.

Não sou profeta, mas estudo mídia há mais de 40 anos e sei que mais de 500 pessoas famosas morreram, exatamente por causa dela. Entraram nos seus intrincados labirintos, um dos quais é a fama, sem conhecer as saídas nem o caminho de volta e só saíram de lá mortos. Entre eles contabilizam-se também famosos missionários e pregadores. Sem achar a saída, morreram e até mataram. Tudo começou com a mídia e a fama que qual cavalo xucro, desembestou, ou carro sem freio, tomou velocidade e se desgovernou.

É bom lembrar que labirintos às vezes sufocam e matam e que sementes não conhecidas às vezes dão frutos que não se buscava. Conhecer a semente, o cultivo e o solo é fundamental para o semeador. Conhecer as rotas de escape é fundamental para o espeleólogo ou para o alpinista.

Acontece com a mídia moderna que muitos entram nela pela empolgação do momento e da grande chance, ignoram quem a estudou, e, tendo achado uma semente rara, jogam-na ou plantam do seu jeito, sem olhar os detalhes do semeio ou do plantio; acharam a entrada que garantia levar a milhões de ouvidos e olhos e entraram. Foi vôo entusiasmado, mas cego. Todo mundo via, só eles não viam!

Feliz de quem foi até onde podia e voltou atrás. Alguns, infelizmente, não acharam mais a saída. Elvis Presley e Michael Jackson, Marilyn Monroe e o pastor Jim Jones são os mais comentados. Não foi a droga, nem a depressão que os levou. Isso veio depois. Foi a mídia e afama não assimiladas que trouxeram o resto. Feliz do artista, do escritor, do desportista, do cantor, do religioso e da modelo que souberam até onde ir, até onde se deixar levar e quando parar.

Há mídias lentas e mídias velozes demais. Em termos de mídia, a velocidade mata o talento e a alma! Um curso de como lidar com a fama que vem com a mídia seria muito oportuno para quem não percebe que está deslumbrado ou deslumbrada com os holofotes. Artistas mais experientes e religiosos mais vividos tentam aconselhar, mas nem sempre são ouvidos. A chance fala mais alto. É, agora, ou tudo ou nada. Muitos acabam no nada!

Veículo maravilhoso ela pode se encapelar, como oceano em tormenta. Há sempre algum Triângulo das Bermudas em toda mídia. Navegar é preciso, às vezes, fugir é fundamental. Depende de quem foi e até onde foi. Falarei mais sobre o assunto nos próximos temas.


Pe. ZEZINHO, scj

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